A Caminho da Pascoa: Acreditar na Solidariedade, na Partilha é corresponder ao mandato apostolico deixado por Jesus Cristo... somos discipulos e missionarios, chamados a servir ao proximo com caridade, solidariedade e partilha.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

V - Igreja e o Cinema


V - A Igreja e o Cinema


Francisco de Assis Correia *


Não vou escrever nenhuma história desta relação, nem nenhum tratado sobre este tema, alias, apaixonante, sobretudo, neste momento em que se aguarda o Oscar de 2009 (AVATAR ?, Amar sem Escalas ?...?)!
Lendo o Jornal de Opinião (15 à 21/02/2010), deparei-me com uma lista de 45 filmes, divulgados em 1996 pelo Pontifício Conselho para as Comunicações Sociais, organismo da Santa Sé, comemorando o centenário do cinema! Os filmes foram divididos em três categorias: religião, arte e valores, e apresentados como os melhores de todo este período:
Religião
A Paixão - Ferdinand Zecca (França, 1903)
Martírio de Joana d'Arc - Carl Dreyer (França, 1928)
Monsieur Vicent - Maurice Cloche (França, 1947)
As Flores de São Francisco - Roberto Rossellini (Itália, 1950)
Ordet - Carl Dreyer (Dinamarca, 1956)
Ben-Hur - William Wyler (Estados Unidos, 1959)
O Nazareno - Luis Buííuel (México, 1959)
O Evangelho segundo São Mateus - Pier Paolo Pasolini (Itália, 1964)
O Homem que não vendeu sua alma - Fred Zinnemann (Inglaterra, 1966)
Andrei Rublev - Andrei Tarkovsky (União Soviética, (966)
O Sacrificio - Andrei Tarkovsky (Suécia/França, 1986)
A Missão - Roland Joffe (Inglaterra, 1986)
A Festa de Babette - Gabriel Axel (Dinamarca, 1987)
Francesco - Liliana Cavani (Itália, 1988)

Arte

Nosferatu
F.W. Murnau (Alemanha, 1922)
Metropolis - Fritz Lang (Alemanha, 1927)
Napoleão - Abel Gance (França, 1927)
As Quatro Irmãs - George Cukor (Estados Unidos, 1933)
Tempos Modernos - Charles Chaplin (Estados Unidos, 1936)
A Grande Ilusão - Jean Renoir (França, 1937)
No Tempo das Diligências. John Ford (Estados Unidos, 1939)
O Mágico de Oz - Victor Fleming (Estados Unidos, 1939)
Fantasia - Walt Disney (Estados Unidos, 1940)
Cidadão Kane - Orson Welles (Estados Unidos, 1941)
The Lavendar HiII Mob - Charles Chrichton (Inglaterra, 1951)
A Estrada - Federico Fellini (Itália, 1954)
8 1/2 - Federico Fellini (Itália, 1963)
O Leopardo - Luchino Visconti (Itália, 1963)
200I : Uma Odisséia no Espaço - Stanley Kubrick (Inglaterra, 1968)

Valores
Intolerância - D.W. Giffith (Estados Unidos,1916)
Roma, Cidade Aberta - Roberto Rossellini (Itália, 1945)
A Felicidade não se compra - Frank Capra (Estados Unidos, 1947)
Ladrão de Bicicletas· Vittorio De Sica (Itália, 1948)
Sindicato de Ladrões - Elia Kazan (Estados Unidos, 1954)
A Harpa da Birmânia - Kon Ichikawa (Japão, 1956)
Morangos Silvestres - Ingmar Bergman (Suécia, 1957)
O Sétimo Selo -Ingmar Bergman (Suécia, 1957)
Dersu Uzala - Akira Kurosawa (União Soviética/Japão, 1975)
The Tree of Wooden Clogs - Ermanno Olmi (Itália, 1978)
Carruagens de Fogo - Hugh Hudson (Inglaterra, 1981)
Gandhi - Richard Attenborough (Inglaterra, 1982)
Adeus, meninos - Louis Malle (França, 1987)
O Decálogo - Krzystof Kieslowski (Polônia, 1988)
A Lista de Schindler - Steven Spielberg (Estados Unidos, 1993)

Destacam-se nesta lista a diversidade de valores e a pluralidade de opções. Claro que os critérios são igualmentes variados para a avaliação. Assim, por exemplo,destes 45 filmes, na lista de Rounald Bergan (Guia Ilustrado Zahar Cnema) de cem melhores filmes, só seis dos aqui listados aparecem! Em Lendo as Imagens do Cinema de Laurent Jullier e Michel Marie 7 !









*Padre Professor Doutor. Leciona no Centro de Estudos da Arquidiocese de Ribeirão Preto (CEARP), em Brodowski - SP

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010


IV- O Programa Nacional de Direitos Humanos
Francisco de Assis Correia *

A publicação do 3º Programa Nacional de Direitos Humanos assinado pelo Presidente Lula e publicada em 21 de dezembro de 2009 tem provocado polêmicas por toda parte.
O Jornal de Opinião da Arquidiocese de Belo Horizonte (edição de 15 a 21/02/2010), muito oportunamente elencou oito propostas deste programa que são mais polemicas; as referentes ao agronegócio, ao sem- terra e reforma agrária, às fortunas, ao controle da mídia, aos militares e documentos da ditadura, aos homossexuais, ao aborto e à religião.
A CNBB reagiu prontamente manifestando-se contraria a 5(cinco) pontos: A descriminalização do aborto, o casamento entre pessoas do mesmo sexo, o direito de adoção de crianças por casais-homoafetivos, a criação de mecanismos para impedir a ostentação de símbolos religiosos em estabelecimentos públicos da União e o cerceamento da imprensa.
Suas razões para ir contra a descriminalização do aborto são as seguintes: “o Programa Nacional de Direitos Humanos quer descriminalizar o aborto tornando-o legítimo e factível até o último dia da gestação. Isto contradiz frontalmente o espírito e a letra (do artigo 3º da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, 10/12/1948). Além disso pretende fazer passar como direito universal à vontade de uma minoria, já que a maioria da população brasileira manifestou explicitamente sua vontade contrária. Fazer aprovar por decreto o que já foi rechaçado repetidas vezes por órgãos legítimos, traz à tona métodos autoritários dos quais com muitos sacrifícios nos libertamos ao restabelecer a democracia no Brasil na década de 80.
Além do mais “a abertura à vida está no centro do desenvolvimento – afirmou o Papa Bento XVI. Quando uma sociedade começa a negar e a suprimir a vida, acaba por deixar de encontrar as motivações e as energias para trabalhar no serviço do verdadeiro bem do homem”(Caritas in Veritate, nº28).
E a polêmica deverá continuar até que se chegue a um consenso com bom senso como costuma dizer o Frei Antonio Moser, O.F.M


*Padre Professor Doutor. Leciona no Centro de Estudos da Arquidiocese de Ribeirão Preto (CEARP), em Brodowski - SP

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010




III – Quaresma, Semana Santa e Páscoa


Francisco de Assis Correia*





1 – Quaresma
Há alguns anos atrás, falar em quaresma era lembrar um tempo tenebroso, feio, cheio de proibições, medo... Tempo de lobisomem, de superstições e de tristeza. Tempo de muita penitencia, de jejuns, de via-sacra, de rezar pelas almas, de procissões do Senhor dos Passos, de Nossa Senhora das Dores. Homens numa. Mulheres noutra. Até o repique dos sinos era diferente. Mais para morto que para vivo. As matracas roucas e repetitivas pareciam anunciar o fim do mundo! Tempo de comer peixe e abster-se de carne. Há gente que, mesmo sem freqüentar a igreja conserva orgulhosamente a tradição de não comer carne às quartas e sextas feiras da quaresma! A legislação da Igreja mudou, mas eles não.
Embora alguns tentem voltar a esse passado mais devocional e tradicional do que atualizar liturgicamente este tempo e torná-lo oportunidade de evangelização e aprofundamento da fé, a quaresma permanece como tempo constituído de cinco semanas através das quais, somos chamados a nos preparar para a páscoa. É tempo de preparação para a maior festa do Cristianismo: a Ressurreição de Cristo. Tudo, neste tempo, tem sentido se for ordenado par uma sincera, autêntica e genuína preparação para a Festa da Páscoa. Caso contrário, vira folclore anual, sem sentido verdadeiramente litúrgico e cristão.
A renovação litúrgica proposta pelo Concilio Vaticano II quis resgatar a verdadeira prática quaresmal. Com este objetivo prescreve:
“Tanto na liturgia, quanto na catequese litúrgica, esclareça-se melhor a dupla índole do tempo quaresmal que, principalmente pela lembrança ou preparação do Batismo e pela penitencia fazendo os fiéis ouvirem com mais freqüência a Palavra de Deus e entregarem-se à oração, os dispõe à celebração do mistério pascal” (SC, 109).
Observa-se, aqui, a primazia da Palavra de Deus. Esta é a primeira missão e obrigação dos ministros da Igreja: pregar. E a quaresma apresenta-se como tempo mais que oportuno para isso. A oração virá como resposta à Palavra anunciada.
Quaresma é igualmente tempo de conversão entendida como mudança de vida para melhor; retomada da vida para que seja mais de acordo com o Evangelho, para produzir bons frutos.
Afastadas aquelas tradições que já não condizem com o autêntico sentido da Quaresma, vivamos intensamente este tempo aguardando vigilantes a Páscoa do Senhor.



2- Semana Santa
A semana santa é assim chamada porque, nela celebramos os principais mistérios da nossa fé cristã: a paixão, a morte e a ressurreição de Jesus Cristo.
Ela se inicia com o Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor.
De Ramos, porque neste dia, fazemos a memória da entrada do Senhor em Jerusalém, com a benção e a procissão de ramos.
Da Paixão do Senhor, porque se proclama a Paixão segundo um dos Evangelistas Sinópticos. Neste ano é proclamada a Paixão segundo Lucas.
Vem, depois, o chamado Tríduo Pascal, que compreende a Quinta- Feira Santa, a Sexta-Feira Santa e o Sábado Santo que, segundo Santo Agostinho é “o sacratíssimo Tríduo do Crucificado, Sepultado e Ressuscitado”.
Quinta-feira Santa: nas catedrais, celebra-se, pela manhã a missa do Crisma. À tarde, em todas as paróquias, celebra-se a Missa da Ceia do Senhor, com o Rito do Lava-pés.
Sexta-Feira Santa: celebra-se a Paixão e Morte do Senhor. Não há missa neste dia. Mas há, a proclamação da Paixão segundo São João, as orações solenes, a adoração da Cruz e a comunhão.
Sábado Santo: à noite celebra-se a Vigília, mãe de todas as vigílias que é a Vigília Pascal, que compreende: a Celebração da Luz, a Liturgia da Palavra, a Liturgia Batismal e a Liturgia Eucarística.
Termina assim, o Tríduo Pascal.
O Domingo da Páscoa na Ressurreição do Senhor chamado “Domingo dos domingos”, “Festa das festas”, “Rainha de todas as festas, de todos os domingos, de todos os dias do ano”. Celebramos Aquele que venceu a morte ressuscitando e dando-nos a esperança de que, também nós haveremos de ressuscitar e viveremos com Ele. Aleluia!
Segue o Tempo Pascal até o Domingo de Pentecostes que, neste ano celebra-se no dia 23 de maio.





*Padre Professor Doutor. Leciona no Centro de Estudos da Arquidiocese de Ribeirão Preto (CEARP), em Brodowski - SP

sábado, 13 de fevereiro de 2010

3. Solidariedade


Francisco de Assis Correia*



A CFE-2010 insiste na solidariedade. Esta precisa ser apreendida.


“Aprender a solidariedade significa amar o próximo também nas dimensões globais, em uma interdependência mundial” (nº 24).


“A solidariedade faz da humanidade uma família onde todos se protegem mutuamente. Assim problemas que pareciam insolúveis podem ter soluções surpreendentes. A partilha faz milagres” (p.59).


“A solidariedade aumenta nossa sensibilidade aos aspectos específicos da dor e da humilhação de outros seres humanos”(p.60).


“Na tradição cristã não encontramos apenas a caridade de indivíduos ou a generosa solidariedade de comunidades inteiras. Também buscou-se insistentemente soluções alternativas às estruturas econômicas injustas: criação de hospitais, construção de

escolas, organização de economia comunitária, organização de sindicatos e partilha. Hoje como no passado, as comunidades cristãs devem se interrogar sobre seu patrimônio, seu uso do dinheiro e seu compromisso com a transformação econômica e social do Pais”(p.65).


“É missão das comunidades cristãs dar testemunho de solidariedade e educar os incluídos na sociedade da abundancia e do consumismo para que valorizem o ser humano na sua dignidade e não nas aparências e adquiram espírito critico em relação à propaganda... “(p.71).


“A solidariedade aumenta nossa sensibilidade à dor e à humilhação de outros seres humanos”(p.237).


A solidariedade, no texto, é apresentada como a perspectiva “para mudar o atual rumo de desenvolvimento”; “a inclusão de todos e todas nos benefícios do desenvolvimento como direito de cidadania. Trata-se da valorização da cooperação, da responsabilidade coletiva e compartilhada em favor da construção da sociedade mais justa, com a superação das desigualdades socioeconômicas, étnicas, de gênero e de geração”(p.306).


A proposta da CFE-2010 é a Economia Solidaria entendida como “um jeito de fazer a atividade econômica de produção, oferta de serviços, comercialização, finanças ou consumo baseado na democracia e na cooperação, o que chamamos de autogestão: ou seja, na Economia solidaria não existe patrão nem empregados, pois todos os/as integrantes do empreendimento (associação, cooperativa ou grupo) são ao mesmo tempo trabalhadores e donos.


A Economia Solidária é também um jeito de estar no mundo e de consumir (em casa, em eventos ou no trabalho) produtos locais, saudáveis, da Economia Solidaria, que não afetem o meio ambiente, que não tenham transgênicos e nem beneficiem grandes empresas.


Por fim, a Economia Solidaria é um movimento social, que luta pela mudança da sociedade, por uma forma diferente de desenvolvimento, que não seja baseada nas grandes empresas nem nos latifúndios com seus proprietários e acionistas, mas sim um desenvolvimento para as pessoas e construída pela população a partir dos valores da solidariedade, da democracia, da cooperação da preservação ambiental e dos direitos humanos”(p.308)



*Padre Professor Doutor. Leciona no Centro de Estudos da Arquidiocese de Ribeirão Preto (CEARP), em Brodowski - SP

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

II - REFLEXÕES EM TORNO DE TEMAS DA CFE – 2010

Francisco de Assis Correia*

1. Novas dimensões da caridade: -

Alerta-se sempre sobre o sentido da palavra caridade. O perigo está em entendê-la só como dar uma esmola. Desencargo de consciência diante de um pobre. Ora, caridade é muito mais do que este gesto.
Há tempo que teólogos tentam alargar o sentido da caridade, virtude das obras de misericórdia e virtude teologal que nos une diretamente a Deus e é a mais sublime das virtudes.
Caridade tem a ver com amor no seu mais profundo sentido de doação, de entrega de vida.
O texto da CFE-2010, muito apropriadamente traduz caridade por solidariedade, o que supõe, imbrica: empatia, compaixão, alteridade, na sua mais alta expressão. E distingue solidariedade assistencial (ou caridade assistencial), solidariedade promocional (ou caridade promocional) e solidariedade libertadora(ou caridade libertadora).
Resumidamente o texto explica:
“Na primeira, dá-se o peixe, cobrindo uma necessidade e um direito imediato; na segunda ensina-se a pescar; na terceira, luta-se junto com os excluídos para ter acesso ao rio e pesca-se com eles.
É na perspectiva do pescar juntos, do construir outra sociedade em que “tudo esteja em comum e não haja necessitados”, que se move o espírito dos Fundos de Solidariedade.(p.120 do Manual da CFE-2010)
O texto, a seguir, explicita cada uma destas dimensoes, que, por sua propriedade e clareza, transcrevo-as:

“Dar o peixe” – há situações de urgência e de emergência em que o apoio aos excluídos não pode esperar. É preciso mobilizar esforços para sua sobrevivência imediata: remédios, alimentos, roupas, lonas, etc. Tais apoios são fundamentais, mas insuficientes para impedir a repetição de situações semelhantes, especialmente quando não são causadas unicamente por fatores naturais (terremotos, inundações, secas, queimadas, etc), pois, em geral, os excluídos, que vivem em situações de risco permanente, são os mais dramaticamente atingidos.

“Ensinar a Pescar” - são ações que visam à capacitação dos excluídos para que possam buscar a superação de suas limitações. São ações educativas e promocionais, fortalecem a autoestima pessoal, valorizam as atividades grupais e comunitárias e estimulam a identidade coletiva. São indispensáveis, inclusive nas situações de emergência, como base de sustentação para ações de superação da exclusão social. Se, porém, limitadas à promoção individual ou do grupo, vão restringir-se à “vara de pesca”, não dando atenção nem valorizando “ o rio que passa”.

“Pescar juntos” – é preciso compreender e conviver com o rio, seus contornos e seus habitantes para poder realizar solidariamente “o milagre da multiplicação dos peixes”. Já não há apoiadores e apoiados, mestres e alunos, dirigentes e dirigidos. Todos estão empenhados na construção de um projeto de sociedade em que se derrubem as barreiras da exclusão e reine a paz. Assim, os grupos e comunidades apoiados pelos Fundos tornam-se “sujeitos construtores da história”. Na medida em que são tratados como “parceiros” solidários dessa caminhada, passam a difundir, articular e ampliar as bases do movimento de solidariedade.”(CFE – 2010, p.120 - 121)
“O mandamento do amor a Deus e ao próximo precisa ser compreendido em toda a sua amplitude, pois inclui, entre outras coisas: optar por uma economia do bem comum e do suficiente, economizar de modo responsável (não como um avarento), reutilizar, reciclar, respeitar com gratidão os dons de Deus e doar com generosidade serviços e bens para socorrer e promover os necessitados.”(CFE-2010, nº 112)

2. A IDOLATRIA DO DINHEIRO
O lema da CFE-2010 proclama: “Vocês não podem servir a Deus e ao Dinheiro”(MT 6, 24).
Idolatria é culto a um ídolo; é divinização de alguma criatura, ou adoração de deuses falsos (ídolos). No caso, é a divinização ou a absolutização do dinheiro.
O lema da CFE-2010 “nos propõe uma escolha ante os valores do plano de Deus e a rendição diante do dinheiro, visto como valor absoluto dirigindo a vida. O problema não é dinheiro em si, mas o uso que dele se faz. É útil como instrumento destinado ao serviço e intercambio de bens de uso, mas não pode ser o supremo comandante dos nossos atos, o critério absoluto das decisões dos indivíduos e do governo. Deve ser usado para servir ao bem comum das pessoas, na partilha e na solidariedade.
Nossa atitude diante do dinheiro mostra muito o tipo de pessoa que somos. Por isso Jesus disse: “onde estiver o teu tesouro ali também estará o teu coração”(Mt 6, 21). Se o enriquecimento e a acumulação continuam a ser o sonho da sociedade, os valores se invertem e colocamos em segundo plano a pessoa, sua vida, sua diginidade, seu bem-estar. A relação com Deus e todos as demais aspirações humanas acabam por serem rebaixadas a valores secundários. Vemos assim que a acumulação, o não repartir, tem profundas conseqüências espirituais”. (nº 70)
Quantas vezes e de maneira cruel o dinheiro se torna a causa da exclusão social, de humilhação e de sofrimento humano!
Já dizia Giovanni Papini, na sua Vida de Cristo: “o dinheiro é excremento do diabo”!
O texto muito apropriadamente adverte as Igrejas para o risco de elas mesmas caírem no culto do dinheiro, com sua “teologia da prosperidade”, “que transforma até a oração numa forma de comércio com Deus. (nº 62)
Ou, com a “teologia da retribuição” que torna a religião “manipuladora de consciências, no que diz respeito ao verdadeiro lugar do valor econômico. Assim, temos muitas instituições religiosas que pregam a chamada “teologia da retribuição” segundo a qual Deus ajuda principalmente aqueles que ajudam financeiramente a instituição religiosa. Assim, a doação financeira estabelece vínculos comerciais entre a pessoa e o próprio Deus, que se torna sujeito de obrigações perante o fiel. Outro problema que surge é que a religião fica reduzida a questões do dia-a-dia, sem abrir-se ao transcendente e sem buscar os significados mais profundos da existência humana ou o empenho, em vista à transformação social”. (p.291).
Estão a negociar com um ídolo e não cultuando o verdadeiro Deus, Pai de Jesus Cristo.
O texto-base da CFE-2010, muito profeticamente, traz um apelo às Igrejas que reproduzo a seguir:
“Nós, Igreja e crentes, somos chamados a encarar a realidade do mundo a partir da perspectiva das pessoas, particularmente das pessoas oprimidas e excluídas. Somos chamados a ser comunidades não-conformistas e transformadoras. Somos chamados a nos deixar transformar mediante a libertação das nossas mentes da postura imperial dominadora, conquistadora e egoísta, assim praticando a vontade de Deus (de acordo com a Torá), a qual é cumprida em amor(ágape, em grego) e solidariedade (Rm 13, 10,1; Jo 3, 10-24). Comunidades transformadoras são transformadas pela graça amorosa de Deus. Elas praticam uma economia de solidariedade e compartilhamento. Na qualidade de igrejas que somos chamados a criar espaços para a transformação e nos tornar agentes de transformação, mesmo se estivermos enredados e mancomunados com o próprio sistema a cuja mudança somos chamados a estar juntos com o povo que sofre e com a Criação que geme, em solidariedade com aqueles que estão construindo comunidades alternativas de vida. O lugar das Igrejas é onde Deus está atuando, Cristo está sofrendo e o Espírito está cuidando da vida e resistindo aos principados e poderes destrutivos. As igrejas que se mantiverem distantes desse lugar concreto do Deus Triúno não podem afirmar que são igrejas fiéis”. (nº 68)
Para evitar qualquer dúvida ou suspeita quanto ao uso do dinheiro nas Igrejas, como em qualquer instituição, é imprescindível a transparência na indispensável prestação de contas.








*Padre Professor Doutor. Leciona no Centro de Estudos da Arquidiocese de Ribeirão Preto (CEARP), em Brodowski - SP

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Solidariedade e Paz


Campanha da Fraternidade
- 2010 -
Francisco de Assis Correia*
  1. Neste ano de 2010 a Campanha da Fraternidade é Ecumênica

Seu tema: Economia e vida
Seu lema: "Vocês não podem servir a Deus e ao Dinheiro" (Mt, 6,24)
É a terceira Campanha da Fraternidade Ecumênica.
A primeira foi em 2000, com o tema: "Dignidade Humana e Paz"; e o lema: "Novo Milênio sem exclusões".
A segunda foi em 2005, com o tema: "Solidariedade e Paz"; e o lema: "Felizes os que promovem a Paz".
É Ecumênica, porque reúne o trabalho das Igrejas que fazem parte do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC); : Igreja Católica, Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, Igreja Presbiteriana Unida do Brasil e Igreja Sírian Ortodoxa de Antioquia.
"O que move as Igrejas a agir é a graça, o amor de Deus e o testemunho de sua fé em Jesus Cristo".
O objetivo geral da CFE (Campanha da Fraternidade Ecumênica) deste ano é: "Colaborar na promoção de uma Economia a Serviço da Vida, fundamentada no Ideal da Cultura da Paz, a partir do esforço conjunto das Igrejas Cristãs e de pessoas de boa vontade, para que todos contribuam na construção do bem comum em vista de uma sociedade sem exclusão".
Ela busca inspiração na Fé Cristã para fomentar uma economia que atenda às necessidades básicas de todos os seres humanos.
Por isso, seus objetivos específicos são:
- "sensibilizar a sociedade sobre a importância de valorizar todas as pessoas que a constituem.
- buscar a superação do consumismo, que faz com que o "ter" seja mais importante do que as pessoas.
-criar laços entre as pessoas de convivência mais próxima em vista do conhecimento mútuo e da superação tanto do individualismo como das dificuldades pessoais.
-mostrar a relação entre fé e vida, a partir da prática da justiça, como dimensão constitutiva do anúncio do Evangelho.
-reconhecer as responsabilidades individuais diante dos problemas decorrentes da vida econômica em vista da própria conversão" (CFE, 19).
Esses objetivos, no texto-base, são trabalhados em quatro níveis: social, eclesial, comunitário e pessoal.
O mesmo está dividido em cinco partes:

- introdução: A vida em primeiro lugar
-a vida ameaçada
- economia para a vida
-promover a vida
- conclusão
E o texto se encerra com um rico comentário ao Pai-Nosso, lido e rezado à luz do tema da CFE 2010.
Comentarei a seguir o referido texto, parte por parte.

2. A Vida em Primeiro Lugar

Este é o titulo da Introdução do texto-base.
Começa contrapondo a dádiva da vida e a lógica do mercado. Diante da primeira, importa, saibamos ser agradecidos; diante da segunda, importa tenhamos consciência de que há valores que “não se podem nem se devem vender e comprar”.
“A dádiva nos introduz num círculo onde tudo é graça e solidariedade”. Mas, também, de interdependência mundial e corresponsabilidade mútua.
Precisamos de uma economia que sirva à vida e não de vida a serviço da economia. Esta não é autônoma. Ela tem “a obrigação moral de garantir oportunidades iguais, satisfazer as necessidades básicas das pessoas e buscar a justiça”.
É dentro desta perspectiva que se examina, por exemplo, o valor econômico da água. Essa não é uma mercadoria. Ela tem dimensão de direito humano, caráter vital, sagrado.
O mesmo critério estende-se ao Planeta Terra, diante do qual importa o cuidado, a preservação e o respeito.
Felizmente, crescem, hoje, iniciativas a favor da vida, dos desamparados, do desenvolvimento sustentável e do ponto de vista social e ecológico.


3. A Vida Ameaçada

A primeira parte do texto-base corresponde ao ver a realidade, tal como ela se apresenta. Esta se revela com o número incontável de pobres, tanto no Brasil como no mundo em geral; de desigualdade, de indigência.
Os pobres não são apenas destinatários da compaixão das Igrejas. É preciso promover, com urgência e eficiência, os direitos dos pobres, facilitar-lhes o ingresso na cidadania plena: valorizá-los, ser ouvidos, levados a serio...
O sonho de todas as pessoas é desfrutar de uma vida longa, saudável e criativa. “Isso é um direito universal e uma necessidade que implica o bem de toda a sociedade”.
Obstáculos a serem superados: o individualismo, a falsa ética utilitária, o consumismo, o lucro excessivo, a acumulação da riqueza, a fome, a desnutrição, a pobreza, o desenvolvimento equilibrado, a valorização do patrimônio em detrimento a vida dos pobres, a escravidão dos trabalhadores, a dívida interna e externa, a dívida social, a falta da reforma agrária, a corrupção, a degradação do meio ambiente, a deterioração do trabalho, a privação de direitos fundamentais...

4. Economia para a vida

Trata-se da segunda parte do texto-base. Momento do julgar, à luz da fé cristã, a realidade encontrada.
À luz do lema proposto: “Vocês não podem servir a Deus e ao Dinheiro” (Mt 6,24), somos convidados a escolher entre “os valores dos planos de Deus e a rendição diante do dinheiro, visto como valor absoluto dirigindo a vida. O problema não é o dinheiro em si mas o uso que dele se faz”.
Por isso, é necessário haja um sistema econômico para todas as pessoas conforme o plano de Deus que quer o bem de todos. Ou “vivemos solidariamente como irmãos ou seremos todos infelizes num mundo trágico”. E, de acordo com a Palavra de Deus, o trabalho apresenta uma escala de prioridades em quatro dimensões: social, comunitária, pessoal e eclesial e da pratica religiosa (nº72).
Vemos pela bíblia como Deus repartiu a terra fraternalmente entre as tribos; como Ele quer o trato, o cuidado e o desvelo para com a terra; como Ele quer justiça para os pobres; como Ele proíbe empréstimo com juros; Ele quer que os trabalhadores sejam respeitados em sua dignidade; no Reino de Deus a lei é a solidariedade; Deus quer ser amado e servido nos pobres...

5. Promover a Vida

A terceira parte resume o agir no promover a vida. Isto é:
- no âmbito social, servir a Deus e não ao dinheiro exige a promoção de políticas que dêem a todos o direito de desenvolver seus talentos e viver dignamente.
- no âmbito comunitário estar atentos ao que acontece à nossa volta e militar em todas as frentes.
- no âmbito eclesial, servir mais a Deus e ao próximo, estando a serviço das causas sociais.
- no âmbito pessoal, educar-se e educar para o respeito ao direito de todos, para o cuidado responsável com o planeta, para a resistência às seduções do consumismo, para valorizar cada um pelo que é, pelo potencial que tem e não por aquilo que possui como riqueza material. Nesse espírit, devemos estar preparados para o protesto profético sempre que for necessário.
O texto denuncia a perversidade de todo modelo econômico que vise em primeiro lugar o lucro, sem se importar com a desigualdade e miséria, fome e morte”.
Afirma que “a economia deve sustentar a qualidade da vida de todas as pessoas no limite das condições sustentáveis ao Planeta e deve servir ao bem comum, universalizando os direitos sociais, culturais e econômicos”.
Busca “linhas de compromisso concreto de ação para que a riqueza e a política econômica sejam colocadas a serviço do desenvolvimento integral de toda sociedade brasileira e da humanidade. Sem passar a ações bem concretas na vida de cada pessoa e da política de Estado, sem dar novos rumos às metas e finalidades da organização da economia, toda boa intenção e todo bom discurso moral se tornam vazios”.
Conclama a todos para ações sociais e políticas capazes de implantar um modelo econômico de solidariedade e justiça para todas as pessoas”.
Destaca “a importância da ação coletiva para a transformação social. O dialogo permanente e a articulação das forças sociais, a colaboração entre Igrejas e sociedades etc ...”.
Tratando do ecumenismo e da opção pelos pobres como “adesão livre ao mandamento do Senhor”, o texto brinda-nos com esta máxima: “O cristão é um servidor não alguém que recorre a Deus em busca de favor” (nº109).
Propõe ainda: educação para a solidariedade, desenvolvimento de processos de educação popular, dar testemunho de solidariedade, educar os indivíduos na sociedade da abundancia e do consumismo, optar por uma economia do bem comum e do suficiente, economizar de modo responsável (não como um avarento), reutilizar, reciclar, respeitar com gratidão os dons de Deus e doar com generosidade serviços e bens para socorrer e promover os necessitados...
O texto atualiza, também, o que hoje, é estar do lado dos pequenos:
-não é somente dar esmola ou distribuir comida
-é criar consciência dos direitos e incluir na cidadania
-valorizar o trabalho
-inventar novas formas de trabalho produtivo
-integrar todas as pessoas em atividades remuneradas
-e exigir a proteção social para as pessoas em necessidade
Propõe, ainda, lutas que visem a conquista da emancipação do ser humano e do trabalho (com seis propostas concretas), criar um novo conceito de sistema bancário, políticas públicas e seguridade social (com seis propostas concretas), preservação do meio ambiente e reforma agrária.

*Padre Professor Doutor. Leciona no Centro de Estudos da Arquidiocese de Ribeirão Preto (CEARP), em Brodowski - SP