A Caminho da Pascoa: Acreditar na Solidariedade, na Partilha é corresponder ao mandato apostolico deixado por Jesus Cristo... somos discipulos e missionarios, chamados a servir ao proximo com caridade, solidariedade e partilha.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

II - REFLEXÕES EM TORNO DE TEMAS DA CFE – 2010

Francisco de Assis Correia*

1. Novas dimensões da caridade: -

Alerta-se sempre sobre o sentido da palavra caridade. O perigo está em entendê-la só como dar uma esmola. Desencargo de consciência diante de um pobre. Ora, caridade é muito mais do que este gesto.
Há tempo que teólogos tentam alargar o sentido da caridade, virtude das obras de misericórdia e virtude teologal que nos une diretamente a Deus e é a mais sublime das virtudes.
Caridade tem a ver com amor no seu mais profundo sentido de doação, de entrega de vida.
O texto da CFE-2010, muito apropriadamente traduz caridade por solidariedade, o que supõe, imbrica: empatia, compaixão, alteridade, na sua mais alta expressão. E distingue solidariedade assistencial (ou caridade assistencial), solidariedade promocional (ou caridade promocional) e solidariedade libertadora(ou caridade libertadora).
Resumidamente o texto explica:
“Na primeira, dá-se o peixe, cobrindo uma necessidade e um direito imediato; na segunda ensina-se a pescar; na terceira, luta-se junto com os excluídos para ter acesso ao rio e pesca-se com eles.
É na perspectiva do pescar juntos, do construir outra sociedade em que “tudo esteja em comum e não haja necessitados”, que se move o espírito dos Fundos de Solidariedade.(p.120 do Manual da CFE-2010)
O texto, a seguir, explicita cada uma destas dimensoes, que, por sua propriedade e clareza, transcrevo-as:

“Dar o peixe” – há situações de urgência e de emergência em que o apoio aos excluídos não pode esperar. É preciso mobilizar esforços para sua sobrevivência imediata: remédios, alimentos, roupas, lonas, etc. Tais apoios são fundamentais, mas insuficientes para impedir a repetição de situações semelhantes, especialmente quando não são causadas unicamente por fatores naturais (terremotos, inundações, secas, queimadas, etc), pois, em geral, os excluídos, que vivem em situações de risco permanente, são os mais dramaticamente atingidos.

“Ensinar a Pescar” - são ações que visam à capacitação dos excluídos para que possam buscar a superação de suas limitações. São ações educativas e promocionais, fortalecem a autoestima pessoal, valorizam as atividades grupais e comunitárias e estimulam a identidade coletiva. São indispensáveis, inclusive nas situações de emergência, como base de sustentação para ações de superação da exclusão social. Se, porém, limitadas à promoção individual ou do grupo, vão restringir-se à “vara de pesca”, não dando atenção nem valorizando “ o rio que passa”.

“Pescar juntos” – é preciso compreender e conviver com o rio, seus contornos e seus habitantes para poder realizar solidariamente “o milagre da multiplicação dos peixes”. Já não há apoiadores e apoiados, mestres e alunos, dirigentes e dirigidos. Todos estão empenhados na construção de um projeto de sociedade em que se derrubem as barreiras da exclusão e reine a paz. Assim, os grupos e comunidades apoiados pelos Fundos tornam-se “sujeitos construtores da história”. Na medida em que são tratados como “parceiros” solidários dessa caminhada, passam a difundir, articular e ampliar as bases do movimento de solidariedade.”(CFE – 2010, p.120 - 121)
“O mandamento do amor a Deus e ao próximo precisa ser compreendido em toda a sua amplitude, pois inclui, entre outras coisas: optar por uma economia do bem comum e do suficiente, economizar de modo responsável (não como um avarento), reutilizar, reciclar, respeitar com gratidão os dons de Deus e doar com generosidade serviços e bens para socorrer e promover os necessitados.”(CFE-2010, nº 112)

2. A IDOLATRIA DO DINHEIRO
O lema da CFE-2010 proclama: “Vocês não podem servir a Deus e ao Dinheiro”(MT 6, 24).
Idolatria é culto a um ídolo; é divinização de alguma criatura, ou adoração de deuses falsos (ídolos). No caso, é a divinização ou a absolutização do dinheiro.
O lema da CFE-2010 “nos propõe uma escolha ante os valores do plano de Deus e a rendição diante do dinheiro, visto como valor absoluto dirigindo a vida. O problema não é dinheiro em si, mas o uso que dele se faz. É útil como instrumento destinado ao serviço e intercambio de bens de uso, mas não pode ser o supremo comandante dos nossos atos, o critério absoluto das decisões dos indivíduos e do governo. Deve ser usado para servir ao bem comum das pessoas, na partilha e na solidariedade.
Nossa atitude diante do dinheiro mostra muito o tipo de pessoa que somos. Por isso Jesus disse: “onde estiver o teu tesouro ali também estará o teu coração”(Mt 6, 21). Se o enriquecimento e a acumulação continuam a ser o sonho da sociedade, os valores se invertem e colocamos em segundo plano a pessoa, sua vida, sua diginidade, seu bem-estar. A relação com Deus e todos as demais aspirações humanas acabam por serem rebaixadas a valores secundários. Vemos assim que a acumulação, o não repartir, tem profundas conseqüências espirituais”. (nº 70)
Quantas vezes e de maneira cruel o dinheiro se torna a causa da exclusão social, de humilhação e de sofrimento humano!
Já dizia Giovanni Papini, na sua Vida de Cristo: “o dinheiro é excremento do diabo”!
O texto muito apropriadamente adverte as Igrejas para o risco de elas mesmas caírem no culto do dinheiro, com sua “teologia da prosperidade”, “que transforma até a oração numa forma de comércio com Deus. (nº 62)
Ou, com a “teologia da retribuição” que torna a religião “manipuladora de consciências, no que diz respeito ao verdadeiro lugar do valor econômico. Assim, temos muitas instituições religiosas que pregam a chamada “teologia da retribuição” segundo a qual Deus ajuda principalmente aqueles que ajudam financeiramente a instituição religiosa. Assim, a doação financeira estabelece vínculos comerciais entre a pessoa e o próprio Deus, que se torna sujeito de obrigações perante o fiel. Outro problema que surge é que a religião fica reduzida a questões do dia-a-dia, sem abrir-se ao transcendente e sem buscar os significados mais profundos da existência humana ou o empenho, em vista à transformação social”. (p.291).
Estão a negociar com um ídolo e não cultuando o verdadeiro Deus, Pai de Jesus Cristo.
O texto-base da CFE-2010, muito profeticamente, traz um apelo às Igrejas que reproduzo a seguir:
“Nós, Igreja e crentes, somos chamados a encarar a realidade do mundo a partir da perspectiva das pessoas, particularmente das pessoas oprimidas e excluídas. Somos chamados a ser comunidades não-conformistas e transformadoras. Somos chamados a nos deixar transformar mediante a libertação das nossas mentes da postura imperial dominadora, conquistadora e egoísta, assim praticando a vontade de Deus (de acordo com a Torá), a qual é cumprida em amor(ágape, em grego) e solidariedade (Rm 13, 10,1; Jo 3, 10-24). Comunidades transformadoras são transformadas pela graça amorosa de Deus. Elas praticam uma economia de solidariedade e compartilhamento. Na qualidade de igrejas que somos chamados a criar espaços para a transformação e nos tornar agentes de transformação, mesmo se estivermos enredados e mancomunados com o próprio sistema a cuja mudança somos chamados a estar juntos com o povo que sofre e com a Criação que geme, em solidariedade com aqueles que estão construindo comunidades alternativas de vida. O lugar das Igrejas é onde Deus está atuando, Cristo está sofrendo e o Espírito está cuidando da vida e resistindo aos principados e poderes destrutivos. As igrejas que se mantiverem distantes desse lugar concreto do Deus Triúno não podem afirmar que são igrejas fiéis”. (nº 68)
Para evitar qualquer dúvida ou suspeita quanto ao uso do dinheiro nas Igrejas, como em qualquer instituição, é imprescindível a transparência na indispensável prestação de contas.








*Padre Professor Doutor. Leciona no Centro de Estudos da Arquidiocese de Ribeirão Preto (CEARP), em Brodowski - SP

Nenhum comentário:

Postar um comentário